No início de 2010 encontrei com Felipe por acaso na rua. Estava com minha bicicleta e ele a pé, então desci da bicicleta e fui levando-a enquanto conversávamos. Foi a primeira vez que ele me falou de Performance Diária.
Disse a ele que poderia desenhar uma performance sobre aquele nosso encontro, com O performer levando a bicicleta para passear, assim como estávamos fazendo. Mas pensar em uma performance previamente seria como “roubar” a si próprio, disse Felipe.
Foi então que ele me explicou da regra, de ter de criar a performance da hora que acorda até as 10h da manhã. Pois mesmo que para um quarto vazio, diariamente Felipe performava na busca de uma performance.
Naquele mesmo dia convidei O performer, mesmo que novinho e com poucos meses de vida, para participar do Projecto Multiplo no Chile. Era março e seria a primeira mostra do Multiplo e de O peformer, tanto juntos como separados. Na exposição, havia uma parede coberta por fac-símiles (impressos em jato de tinta sobre papel) dos desenhos originais e colados na parede com fita crepe, assim como o artista fazia em seu quarto.
Durante a mostra, os espectadores podiam levar um fac-símiles, ou mais, consigo. Lembro-me de uma professora da Universidade de Val Paraíso, que apresentou uma das performances em sala de aula, realizando-a com seus alunos. Se não me engano, foi a primeira vez que alguém (a não ser O performer) realizou uma Performance Diária.
A realização das performances por outros tornou-se uma constante. O fato de outros realizarem as performances é uma assunto que vai além do alcance do artista e de seu personagem. As performances estão ai e podem ser realizadas por quem queira, o que me lembra a exposição da Marina Abramovic, The artist is present, em que outros artistas realizavam suas performances.
O que fica é sempre o questionamento, e as muitas dúvidas que um trabalho consegue alcançar. Entendo que em Performance Diária, assim como em muitos outros trabalhos do artista, Felipe procura sempre cutucar a ferida até o fim. O que muitas vezes é incomodo e doloroso.
Performance diária
Felipe Bittencourt
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Performance diária, projeto do artista Felipe Bittencourt (Divulgação)
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Performance diária, de Felipe Bittencourt (Foto: Divulgação)
Paula Borghi
Paula Borghi é graduada em Artes Visuais pela FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado). Integra o grupo de crítica do CCSP (Centro Cultural São Paulo) e do Paço das Artes, além de ser associada ao grupo de gestores da Curatoria Forense. Desde 2011 desenvolve seu projeto de curadoria itinerante Projecto Multiplo, exibido no MOMA – PS1, no Museu de Arte Contemporânea de Quito, na Galeria Meridión ac, na Universidade de Córdoba e no Espacio G. Foi selecionada para o projeto Novos Curadores (2010) e para o 15º Festival Cultura Inglesa com a mostra UnFreeze (2011). Vive e trabalha entre São Paulo e Buenos Aires.