Marcelo Monzani
O que está em cima são frases confeccionadas em plotter, adesivadas nas estruturas triangulares que servem de suporte para luminárias do teto do espaço expositivo. O que está em baixo é uma projeção no piso destas mesmas frases, em movimento, que podem ser manipuladas pelo público-participante modificando sua forma gráfica, o ritmo e o tempo de exposição das palavras. Compondo o espaço, sons e ruídos se rearticulam a cada intervenção.
A trajetória artística de Giancarlo Lorenci é marcada pela experimentação e grande consistência conceitual. Em trabalhos como Hypnorder e Intercombinatorium, explora de forma sistemática as múltiplas possibilidades de transformações estruturais e visuais de palavras e textos, tornando-os ambíguos em seus significados. Se utilizou também de códigos gráficos, como setas e alvos que, modificados, se inter-relacionam como ícones da nossa incomunicabilidade cotidiana.
O que está em Cima e o que está em Baixo está em sintonia e dialoga com sua produção anterior, mas com alterações significativas na formalização e criação de sentidos, pois, contemporâneo que é, explora novas possibilidades técnicas propiciadas pela pesquisa multidisciplinar que vem desenvolvendo atualmente em conjunto com o webmaster Regener Vieira.
O espaço entre nós é ocupado pelo trabalho que se apropria da realidade. O artista não trabalha com a possibilidade da representação clássica, e sim se apropria do espaço arquitetônico do Paço das Artes que se torna o próprio suporte do trabalho, como parte constituinte da relação entre os signos expostos: os verbais, imagéticos e indiciais, criando ambiguidades e deixando para cada espectador as múltiplas escolhas que resultam em novas possibilidades estéticas e perceptivas. A interatividade física – o corpo e o olhar deslocam-se para cima e para baixo – e a semântica, na materialidade e comunicabilidade aparente das palavras que, modificadas, ressaltam a fragilidade da normatização simbólica em nossa sociedade. Lembrando-nos ser ainda possível intervir e transformar o que nos parece irremediavelmente finito.
Assim, a escrita, codificação padronizada, perde o seu sentido funcional, insinuando-se ambígua e ilimitada. Indo além na exploração do potencial gráfico-visual das palavras encontramos uma outra substância, gerada pelo imaterial projetado e sonorizado, tornando-se o único registro possível. Os ruídos e a fragmentação verbal explicitam a busca por novas significações, escapando dos rótulos e definições apriorísticas.
Do tempo inexistente ao ainda aparente – onde o som, ruídos pairando no espaço e palavras disformes são agrupados, embaralhando nossas referências – o imaterial e o material resultante imprimem em nossa memória fragmentos sem sentidos e aquilo que não conhecemos passa a ser, naquele único instante e local, uma nova possibilidade de descoberta da relação entre espaço, tempo, imagem e a nossa própria percepção.