Domitilia Coelho

São Paulo/SP, 1971

  • Maquete da instalação Casa Real (2002-2004)
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Domitilia Coelho

A cidade de São Paulo é palco do trabalho da fotógrafa Domitilha Coelho. Fascinada por suas luzes e pela vida cotidiana, a artista fotografa vitrines de dentro do seu carro; suas fotos são apresentadas em backlights, ou caixas de luz, afirmando seu interesse pela luz como instrumento de sedução. Em 2003, na exposição Arquiteturas subjetivas, na Temporada de Projetos, apresentou uma ampliação de um ambiente de revista de decoração em tamanho de painel publicitário. Em 2009, participou da exposição Intimidade, no Sesc Pompeia. Possui obras em coleções públicas, como Museu de Arte Moderna de São Paulo.

Juliana Monachesi

Quatro artistas decididos a demolir paredes: do ateliê, da casa, do inconsciente, do fotograma. Os trabalhos de Amilcar Packer, Domitilia Coelho, Odires Mlászho e Paulo D'Alessandro apresentados nesta exposição - feita pelo Paço das Artes em parceria com a Galeria Vermelho - provocam uma incômoda consciência sobre a condição urbana hoje, a experiência de viver e produzir arte em uma megacidade como São Paulo, a relação entre corpo e espaço, além do questionamento sobre os limites e possibilidades do suporte fotográfico. 

Amilcar Packer realiza performances a portas fechadas e fotografa diretamente da tela da TV cenas de suas interações com roupas, móveis e espaços vazios. Na série de subversões dos usos de vestimenta e objetos do cotidiano, o artista vinha pondo em questão a identidade cultural determinada pelas escolhas e posses de cada um. Na série mais recente, ele mimetiza com o corpo ângulos de parede e, buscando certa simbiose entre o corpo e o concreto que o cerca, Packer trata da coisificação humana. Faz o corpo se insurgir contra a submissão à arquitetura, mas também extrai a possibilidade de encantamento com as mesmas coisas que alienam o ser humano. Também na obra de Paulo D'Alessandro a subjetividade é inserida na arquitetura, mas por meio de decisões e dúvidas de enquadramento. A presença humana é visível em suas fotografias pelos vestígios que o homem deixa ao construir, demolir, interferir no espaço. Na obra que expõe no Paço das Artes, o artista põe nas mãos do espectador a operação com que engendra suas fotografias: o jogo de múltipla exposição do fotograma ao longo de um mesmo filme, subversão do "momento decisivo" da tradição moderna, é levado às últimas consequências em seu álbum de fotografia no qual a arquitetura de um pavilhão do Carandiru é esquartejada, resultando em um longo e único negativo pleno de uma centena de enquadramentos. 

No trabalho de Domitilia Coelho, o espectador experimenta uma operação paradoxal: estar fisicamente dentro de um painel publicitário, habitar um ambiente irreal de revista de decoração. A discussão que a artista persegue, desde as fotografias de silhuetas humanas sem identidade contra um fundo de fria iluminação urbana, da permeabilidade entre público e privado, aqui atinge uma dimensão inédita. Consequência poética dos backlights de acrílico expostos na Temporada de Projetos de 2001-2002 (em que a estrutura que ilumina a ampliação fotográfica era revelada), a instalação ironiza o sequestro da privacidade que se vivencia nos dias de hoje (a outra face da mesma moeda é o exibicionismo). 

Revirando os subterrâneos da cidade, Odires Mlászho produz imagens que escarnecem da assepsia urbana. Em sua série "Escarificação" (cortes cirúrgicos realizados sobre imagens de um antigo manual da vida saudável, fotografados e ampliados, dando a ver texturas e feridas da Intervenção), atletas espectrais ensinam a respirar corretamente, a realizar um abdominal etc. Seus fantasmáticos personagens transportam o imaginário ao cerne da patológica "arquitetura da destruição". A memória soterrada irrompe também nas fotografias da série "Um Animal Farejando o Teu Sono", relicários e rituais para os mortos.

As ficções fotográficas criadas pelos quatro artistas são narrativas do embate do corpo com uma nova cidade, não mais a Paris do flanêur, senhor das ruas, nem do transeunte do século 20 engolido pela paisagem dos arranha-céus e destituído de identidade, mas de um ser fagócito cuja sensibilidade alia estas duas experiências, reage à cidade, redescobre seus cantos, vê através de seus muros. Apesar da carga crítica dos trabalhos expostos, os quatro artistas são adeptos de certo utopismo, o de talvez, por meio de arquiteturas subjetivas, transformar o olhar sedado.

Domitilia Coelho foi artista convidada para a Temporada de Projetos 2003
  • Realização: