Ivan Grilo

Itatiba - Brasil, 1986

  • Identidade (2011)
    díptico de desenho 
  • Detalhe de Comum União (2011)
    instalação com 250 fotografias medindo cada uma 7x9cm
  • Aparição (2011)
    desenho
  • Detalhe de Aparição (2011)
    desenho
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Ivan Grilo

Ivan Grilo é graduado em artes visuais pela PUC - Campinas. Dentre as individuais que realizou, destacam-se A Pausa do Retrato na Usina do Gasômetro (Porto Alegre, RS), Sujeito Oculto na Galeria Homero Massena (Vitória, ES) e Acúmulo no Museu de Arte de Ribeirão Preto, SP. Participou em 2011 da Bienal de Cerveira (Portugal) e da coletiva Novíssimos na Galeria Ibeu (Rio de Janeiro). Participou também do 35º SARP – Salão de Arte de Ribeirão Preto e do 14º Salão Unama de Pequenos Formatos (Belém, PA), recebendo, neste, prêmio aquisitivo. Vive e trabalha entre Itatiba e Campinas (SP).

Juliana Monachesi

As estéticas do esquecimento e da perda podem ser mapeadas em movimentos entre Walter Benjamin e Andreas Huyssen, ou entre Christian Boltanski e Rachel Whiteread, entre Emil Forman e Rosângela Rennó, ou ainda entre Elisabeth Bishop e valter hugo mãe. Com tantas genealogias visuais, literárias e filosóficas disponíveis a um link de distância, penso que, ao apresentar a obra de um artista nos tempos atuais, muito mais pertinente do que repisar possibilidades genealógicas é tratar da linguagem da obra em questão. Para quem considerar o contrário, ficam acerca da obra de Ivan Grilo as sugestões de navegação pelas tags acima.

Afinal de contas, se é possível percorrer a mostra individual de Grilo no Paço das Artes com este viés da memória e da perda em mente, também é factível deixar estes temas de lado e proceder a uma observação das operações complexas a que ele submete o meio fotográfico. Desde o apagamento de todas as informações identificáveis em registros de nascimento e outros documentos oficiais, dispostos logo na entrada da exposição, até as fotografias antigas reproduzidas por meio de carimbadas sobre papel de grandes dimensões, os procedimentos técnico-conceituais de Ivan Grilo desafiam o estatuto monumentalizante das imagens.

Não se trata aqui de subverter verossimilhança, veracidade ou mesmo a confiabilidade da imagem fotográfica. As obras expostas na Temporada de Projetos são reconhecíveis, verdadeiras e fidedignas. Naquilo que ocultam ou omitem, são ainda perfeitamente gestálticas. Mas naquilo que mostram ou evidenciam, as obras questionam, sim, o aspecto monumental que a fotografia adquiriu culturalmente e que cristalizou socialmente. O uso pelo artista de imagens deslocadas no tempo – antigas fotos de casamento, documentos em desuso, fotos familiares amareladas – está a serviço desta leitura da obra e não o contrário, a obra a serviço do desgastado discurso da memória, como se poderia imaginar.

Caso o artista utilizasse fotografias recentes e coloridas, não veríamos com a mesma facilidade as ruínas dos processos civilizatórios e das demais instituições modernas – ciência, religião, casamento, patrimônio histórico, discursos identitários etc.– que Ivan Grilo encena por meio de processos precários de impressão de imagens: estêncil com verniz diretamente sobre a parede, carimbo sobre papel, acetato aplicado em placas de acrílico, transferência sobre lombada de resmas de papel solto, apagamento digital sobre papel-manteiga. À beira do desaparecimento, estas imagens nos falam do fracasso da monumentalização da cultura, da arte e da vida. São obras, em suma, sobre a derrota da ideologia fotográfica.

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Entrevista concedida à Juliana Monachesi

No mês de setembro, eu tive a oportunidade de visitar dois eventos importantes do “calendário fotográfico” nacional: a SP_Arte/Foto, feira de arte dedicada apenas à fotografia, que acontece no último piso do edifício do shopping Iguatemi, e o Paraty em Foco, festival de fotografia que toma de assalto toda a cidade fluminense durante cinco dias. São acontecimentos breves e intensos, que permitem um mergulho na produção contemporânea e, sobretudo, nas reflexões mais atuais sobre o “imaginário fotográfico”, algo que permeia nossa vida de inúmeras maneiras, desde a avalanche imagética a que somos submetidos no contexto urbano –a publicidade por toda parte, a banca de jornais e a cidade filtrada pela câmera embutida no celular– até a convivência cotidiana com as imagens a que chegamos ou que nos chegam via internet. A vida contemporânea é mediada pela fotografia, o que torna urgentes e mais do que bem-vindas iniciativas como SP_Arte/Foto e Paraty em Foco, que permitem parar para pensar a respeito da paisagem fotográfica em que vivemos imersos.

E, ainda que eu tenha visto muita coisa que provocou umas tantas boas reflexões nestes dois lugares, em nenhum deles eu vi uma proposta tão original sobre este “imaginário fotográfico” como na exposição de Ivan Grilo que está acontecendo agora no Paço das Artes, no âmbito da Temporada de Projetos da instituição. O que há de singular na pesquisa deste jovem artista de Itatiba (SP) é que ele não precisa fotografar, nem se valer necessariamente de fotografias, para propor uma reflexão muito pertinente acerca do imaginário contemporâneo, que poderíamos denominar de “necessidade de desaparecimento das coisas”, sejam elas fotos, memórias fotográficas ou mesmo as “coisas” que tão desesperadamente insistimos em eternizar por meio da fotografia. A entrevista a seguir com o artista, breve e densa, ajuda a desvendar este instigante trabalho.

Você me falou de uma definição do verbo "esquecer" que te interessa especialmente, que é "perder o amor"; como é que essa noção do esquecimento permeia sua produção?

Ivan Grilo: O esquecimento (ou a perda do amor) aparece nos trabalhos quase como um apagamento, algo bem próximo da noção que Valter Hugo Mãe utiliza em seus livros, de um esquecimento como preparação, num sentido de deixar tudo se esvair, permitindo que as coisas desapareçam ou se tornem desimportantes.

Como funciona a sua pesquisa de imagens e de materiais para realizar seus trabalhos?

Ivan Grilo: Como costumo trabalhar somente com imagens vindas de acervos (da caixa de fotografias de famílias a acervos museológicos), essa pesquisa torna-se algo esporádico pela dificuldade de imersão.  Já a pesquisa de materiais é um processo quase diário, uma rotina de ateliê. Assim, costumo pensar o ateliê como laboratório, testando e procurando funções para todo e qualquer material que passe por lá. Essa pesquisa, que costuma ser descompromissada, me fornece simples anotações e protótipos rasos. Curioso pensar que as considero como duas pesquisas distintas, realizadas em dois tempos completamente díspares, mas que num terceiro momento se cruzam e acabam se tornando um só processo indissociável, no qual nem mesmo é possível definir o que é suporte e o que é imagem.

 As personagens da sua obra, em geral, têm suas identidades apagadas (figuras humanas que "perdem" as feições do rosto, documentos  de onde são apagadas as informações identificáveis, construções arquitetônicas que se tornam vultos na impressão sobre a lombada dos blocos de papel etc.). Poderia explicar o porquê desta escolha, deste gesto?

Ivan Grilo: Eu poderia discursar sobre uma tentativa de criar relações com a identidade de todo e qualquer ser, ou ainda sobre uma ideia de quebrar referências históricas e propor relações entre elementos simbólicos; mas acredito que esse gesto venha mesmo de uma tentativa, ainda que frustrada, de questionar/compreender a monumentalidade da fotografia.

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