Caio Reisewitz

São Paulo/Brasil, 1967

  • Série Quadro negro (2000)
    instalação com fotos e lousas
  • Série Quadro negro (2000)
    instalação com fotos e lousas
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Caio Reisewitz

A obra de Caio Reisewitz permeia relações entre registro documental e arte. Na Temporada de Projetos, expôs registros fotográficos de lousas e lousas propriamente ditas. O artista frequentou a Fachobershule für Gestaltung de Darmstadt e se formou na Kunstakademie de Mainz, Alemanha, especializando-se em fotografia. Trabalhou com artistas como Andreas Gursky e Thomas Struth. Em 2004, participou da 26ª Bienal Internacional de São Paulo e, em 2005, da 51ª Bienal de Veneza.

Carla Zaccagnini

Na série de fotografias que mostra nesta exposição, Caio Reisewitz aproxima dois espaços diversos: um dentro do museu e da universidade, outro fora de ambos. O Paço das Artes, duplamente resguardado pela aura do museu e por sua localização no campus da USP, é um local privilegiado para a apresentação destes registros fotográficos de lousas, tomados aqui e em outras partes da cidade, que Caio vem colecionando.
 
A eficiência do quadro negro consiste em propiciar uma superfície escura, rugosa e opaca, capaz de gravar em alto contraste uma quantidade de informação limitada (variando segundo as dimensões do quadro e os hábitos do usuário), porém incessantemente renovável. Sua eficácia reside em utilizar a equação exata entre a porosidade necessária para causar o atrito que desgasta o giz imprimindo seus rastros, e a deposição sucessiva das partículas de cal resultantes que garante a rapidez com que os rastros se apagam ao roçar do feltro. 

Nas fotos de Caio, os textos anteriormente presentes deram lugar a áreas vazias em que se vêem irregulares e suaves resquícios de branco, resultado do movimento do apagador sobre a superfície do quadro. As fotografias registram as variações de comportamento dessas partículas, as inúmeras e quase idênticas configurações que pode assumir esse resto de pó. Imagem única em que se transformam todas as teses e equações, palavras e números do mundo, depois de passar aos cadernos de uns e à memória. 

Por outro lado, esses quadros negros desprovidos já dos textos que abrigaram, voltam a ser o receptáculo infinito, como uma cornucópia ao contrário em que submergem, uma depois da outra e tantas quantas forem necessárias, cada uma das séries de dados que a alimentam, sem que ninguém as conte. O que Caio registra, nessas imagens uniformes, é esse intervalo em que o quadro negro evidencia-se como denominador comum entre as mais diversas instâncias da transmissão oficial de conhecimento, desmascarando a homogeneidade da superfície que precede e sucede toda e qualquer informação que lhe caiba conter. Os quadros negros de diferentes proveniências revelam, nesse lapso temporário, um ponto de tangência entre o espaço de dentro e o de fora, Caio, em suas fotografias, registra e mantém o intervalo, o mesmo que se vê dilatado nas lousas - objetos presentes aqui no espaço de dentro. Durante todo o tempo em que estiverem à espera, sendo vistas pelo público em pé, as lousas permanecerão suspensas, caladas entre a aula anterior e a próxima por muito mais tempo que antes. 

A presença do objeto referencial exposto ao lado dos registros fotográficos [assim como a possibilidade de realização de uma cópia idêntica ao original, para isso mesmo exposto] evidencia um movimento circular de contínuas inversões. O referencial externo se torna obra equivalente à foto a que deu origem [o original serve à execução de cópias mecânicas exatas cujo tempo de vida supera o do primeiro]. Essa cadeia de relações entre as engrenagens de que se compõe a sintaxe das práticas artísticas atua num circuito fechado de comunicação e linguagem. E não por acaso, os quadros negros, esvaziados e à espera [o outdoor em que não se decifram mensagens ou o aparelho de fax que não as envia], evidenciam as lacunas e os lapsos dos nossos sistemas de comunicação. 
  • Realização: