Domitilia Coelho

São Paulo/SP, 1971

  • Sem título (2000)
    transparência fotográfica
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Domitilia Coelho

A cidade de São Paulo é palco do trabalho da fotógrafa Domitilha Coelho. Fascinada por suas luzes e pela vida cotidiana, a artista fotografa vitrines de dentro do seu carro; suas fotos são apresentadas em backlights, ou caixas de luz, afirmando seu interesse pela luz como instrumento de sedução. Em 2003, na exposição Arquiteturas subjetivas, na Temporada de Projetos, apresentou uma ampliação de um ambiente de revista de decoração em tamanho de painel publicitário. Em 2009, participou da exposição Intimidade, no Sesc Pompeia. Possui obras em coleções públicas, como Museu de Arte Moderna de São Paulo.

Daniela Maura Ribeiro

“(...) As ruas da pequena São Paulo de 1900 enchiam-se de fios e de postes” (1). Trinta anos depois a cidadezinha transformava-se em metrópole. Hoje, megacidade, é palco do trabalho da fotógrafa Domitilia Coelho.

As luzes da cidade à noite fascinam Domitilia, que sai acompanhada de sua máquina fotográfica para registrá-las. Especialmente as que iluminam vitrines são o foco das suas lentes. Domitilia percorre ruas em seu veículo buscando as vitrines que serão fotografadas; estaciona para retratá-las mantendo-se dentro do automóvel, preservando assim o distanciamento daquele que está de passagem. Seu interesse reside no elemento luz que é utilizado para iluminar algo que se quer vender. E o que se quer vender? Tudo é vendável, do supérfluo ao necessário. A fotógrafa recorta desse universo os modelos de decorações de interiores expostos nas vitrines da via pública. Sua escolha nasce da necessidade de abordar questões como a padronização do gosto por meio de modelos que ditem comportamento: em que ambiente, com que determinado tipo de móveis e logística, é recomendável viver-se e quão fácil é fazê-lo...

Em se tratando de ambientes para o convívio da vida íntima, cabe citar em paralelo as imagens de residências de famosos veiculadas por revistas, especializadas em demonstrar o padrão social das elites, onde cria-se um ar de aconchego e prosperidade dado pela presença de seus habitantes nos espaços mostrados. Domitilia obtém o resultado inverso: suas imagens são tão frias e vazias quanto os apartamentos e casas pré-decorados, fabricados especialmente para o consumo.

Considerando que vitrine e luz são elementos indissociáveis, caixa de luz e imagem fotográfica também o são: é nas caixas de luz, ou backlights, que Domitilia proporciona ao espectador ver a imagem através do acrílico, numa circunstância similar a de ver vitrines através do vidro. A luz que atravessa a imagem e vaza ao seu redor deixa aparente o processo criativo da artista.

O trabalho de Domitilia abre um leque de possibilidades de discussão em torno da vida cotidiana do cidadão contemporâneo: para onde se dirige, o que faz imerso no vaivém do fluxo urbano, o que o atrai, que luzes o seduzem, quais são seus valores. “(...) ganha toda ênfase a importância da pergunta que o observador dirige à imagem em função de sua própria circunstância e interesse” (2) e o interesse da Domitilia espectadora começa nas luzes da cidade.

“E deixa só uma luz e outra luz e mais outra/ Na distância imprecisa e vagamente perturbadora/ Na distância subitamente impossível de percorrer” (3).

Notas:

(1) ANDRADE, Oswald de. Um homem sem profissão. São Paulo: Globo, Coleção Obras Completas de Oswald de Andrade, 1990. 

(2) XAVIER, Ismail. Cinema: Revelação e Engano. In: NOVAES, Adauto (org.). O Olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

(3) GALHOZ, Maria Aliete (org.). Fernando Pessoa: Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1965.
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