Andrey Zignnatto

São Paulo/Brasil, 1981

  • Andrey Zignnatto
    Erosões
    (Créditos: Letícia Godoy)
  • Andrey Zignnatto
    Manta
    (Créditos: Letícia Godoy)
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Andrey Zignnatto

Artista autodidata, participou de diversos cursos e oficinas da Associação dos Artistas Plásticos de Jundiaí. Em 2013, participou da 4a. Edição do “Colônia de Férias”, realizado no Atelier 397. Frequentou entre 2013/14 o grupo de discussões de projeto Atelier Hermes, com acompanhamento dos artistas Nino Cais e Marcelo Amorim. Participa do grupo de discussões do Atelier Fidalga, com acompanhamento dos artistas Sandra Cinto e Albano Afonso, e do grupo de discussões em arte contemporânea da Escola Entrópica do Instituto Tomie Ohtake. Entre participações de exposições individuais e coletivas, destacam-se: “Estudos Para Novas Propostas de Interpretações do Espaço Físico - Territórios Forjados #1” Complexo Cultural Funarte SP - Prêmio Funarte de Arte Contemporânea/2015, entre outros.

Galciani Neves



Galciani Neves

Galciani Neves entrevista Andrey Zignnatto

G: Sua história pessoal é um disparador para seu trabalho com o tijolo? Como você encara essa relação autobiográfica e ao mesmo tempo questionadora do que você praticava poeticamente?

A: Desde a adolescência produzia pintura em tela, com conhecimentos acadêmicos e uma tendência modernista. Os resultados que alcançava por meio destes procedimentos tradicionais não mais respondiam às minhas expectativas e anseios, não me encontrava mais ali. Também não conseguia encontrar um caminho através da pintura para minhas pesquisas. Pensei que a solução para meus impasses seria encontrar outro lugar [suporte, plataforma, matéria-prima, espaço de produção] fora do meu contexto em que eu estava habituado. Foi então que decidi voltar a uma fábrica de tijolos, a mesma onde, entre os meus 10 e 14 anos, junto com meu avô pedreiro, comprava materiais para construção. Fui até este lugar com um sentimento de abertura para aquele contexto. Queria aprender. Não tinha nenhuma ideia ou um projeto pré-concebido, mas queria passar um tempo ali e viver a dinâmica da fábrica. Nem sabia se aquela experiência iria me render uma pesquisa. Com a autorização do gerente de produção, assumi ali um lugar para produção e, acredito, um outro caminho.

G: Seu trabalho pode apontar, à primeira vista, para um simples processo de apropriação do tijolo. Mas logo se percebe que esta unidade é mais que uma matéria-prima, é também viabilização do gesto, medida do espaço, elemento para pensar o embate entre contextos. Como você lida com todas estas questões que invadem seu processo?

A: Me coloco nas olarias e cerâmicas em um estado que chamo de “presente e disponível” para receber e perceber as “provocações” deste lugar. Acredito que assim reajo a esta experiência e o processo do fazer artístico atua como resposta poética a estas provocações. O tijolo me serve como instrumento para manifestar uma intenção, e não somente matéria para produção de esculturas. O mesmo ocorre na série “Estudos Para Novas Propostas de Interpretações do Espaço Físico”, que considero uma extensão da pesquisa Territórios Forjados. Iniciei esta série quando aluguei um ateliê na cidade de São Paulo para me concentrar na produção de trabalhos de pequenas escalas. Já no primeiro dia de trabalho no local senti uma forte sensação claustrofóbica, acredito que causado pela enorme diferença entre as dimensões das fábricas de tijolos a que estava acostumado a trabalhar. Este espaço inicialmente pensado para desenvolver ideias de trabalhos menores, por fim, acabou como assunto para esta nova pesquisa. Acredito que passei a usufruir de uma lógica pautada em uma percepção um tanto absurda, alterando sistemas de instrumentos e mecanismos utilizados para mensurar objetos e espaços físicos.

G: Como se dão os diálogos entre seus projetos e o espaço que você ocupa?

A: Muitos dos meus trabalhos não são finalizados no ateliê. Parte deste processo se dá inicialmente nos estudos que realizo acerca das características específicas da arquitetura de cada espaço a ser ocupado, seja ele interno ou externo. Alguns trabalhos são pensados a partir destes estudos de forma site-specific. É como se o projeto atravessasse estas distâncias ignorando a fronteira ateliê-espaço expositivo. Penso neste espaço como extensão de meu trabalho, e não simplesmente como suporte. Um lugar para questionar e também ser questionado. O trabalho contamina o espaço expositivo, ao mesmo tempo em que o espaço expositivo contamina o meu trabalho.

G: Dos desenhos preparatórios que integram os projetos das ocupações para o Paço à execução dos trabalhos, o que você sente que muda? Que contaminações esse fazer que se expande no espaço expositivo ocorrem?

A: Um detalhe importante no projeto para o Paço foi meu trânsito constante entre ateliê/fábrica de tijolos e Paço das Artes desde o início do projeto. Já no pré-projeto, antes mesmo do processo de inscrição no edital, fui até o local para estudar cada possibilidade que encontrava na arquitetura do prédio, desde a escadaria externa até seus espaços internos. A mesma ação de permanecer por um tempo na olaria se repete no espaço expositivo, para absorver e compreender melhor este lugar. Entre as várias vezes que fui até o espaço expositivo e voltei para a olaria, novas questões são encontradas e várias vontades vão amadurecendo, proporcionando muitas mudanças na proposta inicial. Acredito que me pus como uma espécie de interlocutor entre ambos os espaços, negociando possibilidades e vontades, como forma de explorar o máximo do potencial que ambos me oferecem para desenvolver cada trabalho. No caso da instalação “Erosões”, por exemplo, inicialmente foi pensada como um cubo posicionado numa sala no interior do prédio. Depois de mais um tempo de estudos. decidi deslocar a montagem do trabalho para a escadaria externa da entrada, da sua parte superior “escorrendo” como uma avalanche para a parte inferior, proporcionando uma dinâmica direta e específica com a arquitetura deste lugar.

G: Integrar-se, conviver e reagir ao contexto da olaria são ações que mobilizam o seu fazer. Há uma espécie de memória residual deste lugar? Você se interessa em configurar uma espécie de tensão entre o contexto original de produção do tijolo e o contexto que ele formula no espaço expositivo?

A: Minha integração ao contexto da olaria é importante para entender o momento ideal e a maneira adequada em que devo agir artisticamente interferindo nos sistemas identificados dentro da fábrica, do processo de produção dos tijolos, dos hábitos dos funcionários, do ambiente proporcionado pelas características do local. Daí, minha ação proporciona um desvio do caminho comum destes sistemas pelas inserções alterando seu fluxo comum.
Esta memória me interessa muito, e pode ser observada na grande maioria dos trabalhos, como por exemplo, em “Erosões”: a maneira em que os blocos são agrupados reflete o mesmo sistema utilizado pela fábrica para estocar os tijolos. Este grande agrupamento de tijolos quando visto no depósito da fábrica é identificado como algo comum, quando colocado no espaço expositivo ele assume outra dimensão material e visual. Acredito que outros trabalhos refletem com mais intensidade esta memória, como o caso de “Estado de Repouso”. Nestas ações, me coloco em posição de descanso: na mesma condição dos materiais que ocupam estes diversos espaços da fábrica. São lugares onde os materiais são postos para um tempo de descanso entre as etapas do processo de produção fabril, também utilizados pelos funcionários nos intervalos para descansar. Já em “Empilhamento”, sigo semelhante ao que acontece com os tijolos que saem com defeito das máquinas, descartados pelos funcionários num gesto de arremesso uns sobre os outros no chão ou uma quina de parede. Tomo 6 unidades de tijolos inteiros conhecidos como “bloco estrutural”, ainda úmidos, e repito este gesto. O tijolo com sua estrutura rígida padrão, resultado do gesto industrial, passa a assumir uma forma orgânica resultado da ação humana. Depois os tijolos são levados ao forno para queima, com o objetivo de preservar as formas adquiridas na ação. Nestes dois casos, o que é apresentado na exposição, tanto as fotos como a escultura, atuam como registros destas ações realizadas dentro da fábrica.

G: Entendendo esses territórios que você chama de forjados, ou seja, eles podem ser uma narrativa ou uma invenção de espaço, que percepções você tenta inserir?

A: Os trabalhos, em geral, propõe uma provocação sobre os mecanismos e sistemas que aprendemos e/ou desenvolvemos para identificar e codificar o mundo em que vivemos. Penso nesta pesquisa como uma resposta poética para uma percepção dos resultados dos gestos do ser humano sobre este mundo e suas consequências. Vivemos em um mundo em que o “artificial” parece comandar esquemas sobre o “natural”. Arrisco dizer que o ser-humano pode ser considerado uma variável nesta equação, sendo o único produto da natureza que não se satisfaz com o que ela oferece, construindo um mundo cada vez mais artificial para saciar suas ansiedades. Mundo este que já passou, e ainda passa, por diversos ciclos de desconstruções e construções. Não digo que isto seja bom ou ruim, mas é um fato. Através do ato de me apropriar e interferir em objetos e sistemas utilizados para a construção deste mundo artificial, subvertendo suas condições originais, este conjunto de trabalhos aponta para caminhos de questionamento de algumas coisas, como as tradições formais e cartesianas de interpretação do mundo físico, ao mesmo tempo em que discute a relação entre homem e este mundo que lhe é tangível.
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