Geraldo Souza Dias

São Paulo/SP, 1954

  • Sem título (2003-2004)
    óleo e colagem
  • Sem título (2003-2004)
    óleo e colagem
  • Atelier (2003)
    óleo, cera, colagem
  • O castelo (2003-2004)
    "instalação de mesa"
    óleo e técnica mista
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Geraldo Souza Dias

Arquiteto, pintor e teórico de arte, Geraldo Souza Dias tem como tema recorrente em sua produção artística a pintura e a palavra. As pequenas pinturas que constroem O castelo trazem fragmentos da vida cotidiana do artista, como páginas de um diário. Em 2007, Dias expôs no Projeto octógono, na Pinacoteca do Estado de São Paulo e, em 2008, fez residência artística na University of the Arts, Philadelphia, PA, EUA. Possui obras em coleções como Berlin-Hannoversche Hypothekenbank AG, Berlim, e Vermont Studio Colony, Johnson, Vermont.

Cauê Alves

Trabalhos recentes de Geraldo Souza Dias, feitos de minúsculas telas, fazem parte de um arquivo pessoal, um diário em que o artista registra diversos eventos e cenas de seu cotidiano. Pequeninas pinturas apresentam retratos, auto-retratos, referências da arte, paisagens, letras, recortes de jornal e imagens inusitadas como a de um tigre ou de um filtro de barro. 

Entretanto, não se pode dizer que todas estejam expostas, a maioria não se deixa contemplar facilmente. A sua função no conjunto é tão estrutural quanto a de uma vértebra. A cuidadosa montagem, em forma de castelo de cartas, traz arranjos de letras que, distanciando-se de meros elementos gráficos, formam palavras em alemão. Em obras anteriores, o artista - que viveu quase dez anos na Alemanha - usou telas de grande formato em que escrevia frases que abordavam, entre outros temas, a migração e a diferença entre o eu e o outro

Nesse trabalho, a imagem também perde a sua primazia, não para o significado das palavras, mas para o chassi, o esqueleto que sustenta o castelo. É como se as pinturas que estão na parte interna do edifício abdicassem da sua exterioridade e planaridade para darem forma a esse organismo piramidal. Elas se ocultam e formam um volume, um corpo em que cada parte deve cumprir sua obrigação sem vacilar, sob pena de comprometer o todo. Lúcidas de que nem todas podem se exibir, menos por questões de cunho privado do diário do que por princípios elementares da construção, elas se acomodam como se estivessem predestinadas a serem alicerces fincados em areia movediça. 

A aparente instabilidade com que estão agrupadas não deixa de remeter ao questionamento que a própria pintura tem que se fazer para se manter em pé. Tratando-se de fragmentos do dia- a-dia do artista, a referência à fragilidade e à dificuldade de se erigir uma obra de pintura também não está distante. Do mesmo modo, o aspecto lúdico da montagem parece aludir a uma atividade que visa mais ao prazer (de montar, brincar, pintar) do que a qualquer outra finalidade. 

Superada a velha querela da morte da pintura, o artista, sempre fiel ao ofício, consegue praticá-Ia sem a necessidade de pincéis, tela e tinta. Em Kunstfarbe, único trabalho da exposição realizado ainda na Alemanha, tiras coloridas de tecidos se entrelaçam em uma grade a céu aberto, mostrando que o campo da pintura é vasto e que ela não se reduz aos tradicionais modos de apresentação. 

Geraldo expõe ainda trabalhos realizados em suportes um pouco maiores, em que, partindo da estrutura de anúncios e encartes de jornais colados em telas, realiza uma pintura que dialoga com a vertente construtiva. Mas nessa relação há muitas dissonâncias que fazem questão de se mostrarem. A limpeza formal e a busca de rigor e objetividade que, aliadas à valorização dos espaços vazios, foram a grande contribuição de alguns artistas construtivos, inclusive no design gráfico, são aqui contaminadas pela vulgaridade do espaço da vida. É como se o artista, com refinada consciência histórica, tivesse como premissa a falência do projeto moderno e, sem ignorá-Ia, prosseguisse com sua pintura. Aos poucos, ela vai se misturando ao mundo sem temer que sua especificidade se dilua na banal idade do cotidiano.

* Geraldo Souza Dias foi artista convidado para a Temporada de Projetos 2004
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