Rogério Ghomes

Ponta Grossa/PR, 1966

  • Carnificina (2002)
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Rogério Ghomes

A angústia da constatação da fragilidade da vida é tema recorrente na obra de Rogério Ghomes, como em Carnificina, uma espécie de carpete que pode ser pisado pelo público. O padrão estampado no tapete é o de um corpo esfacelado que provoca repulsa. Em 2008, o artista realizou a exposição individual Todos precisam de um espelho para lembrar quem são, no Centro Cultural Recoleta, Buenos Aires. Possui obras nos acervos Coleção Joaquim Paiva, Museu de Arte Moderna de São Paulo, entre outros. 

Cauê Alves

Ocupando uma grande superfície com um padrão decorativo em estrutura modular, que ornamenta o chão do espaço expositivo, Rogério Ghomes aborda um tema recorrente em sua trajetória, a angústia da constatação da fragilidade da vida. Formado em desenho industrial, o artista aplica o padrão criado em uma espécie de carpete, que pode ser pisado pelo público. Se a repetição e a superexposição de uma mesma imagem dilui sua carga trágica e retira seu aspecto sacro e aurático, ela poderia intensificar a surpresa da descoberta de que ali se encontra um corpo esfacelado, aspecto ressaltado pela maciez do carpete. A função primeira da decoração, de adornar e tornar o ambiente agradável, é subvertida com esse trabalho. A imagem, que não deixa de ser portadora de uma sedutora beleza, provoca repulsa e aversão. Sua opção, distante de um engajamento ecológico, é causar espanto com o encontro deste pedaço de carne que já foi chamado de golfinho. Afastada da representação iconográfica da morte, tradicionalmente associada ao esqueleto, sua obra não nos deixa esquecer que todos os corpos irão se desfazer e que essa vida terrena será inevitavelmente interrompida. 

Em outras fotos, a presença enigmática e silenciosa de urubus aponta para a mesma temática mórbida. São paisagens permeadas por esses animais que, com o dom de sentir o cheiro da morte a quilômetros de distância, carregam o fardo de serem indícios de carniça. Coerente com as questões que lhe inquietam, Rogério apresenta também alguns canteiros móveis, feitos com fotografias de flores caídas sobre a grama. Jardim da saudade é uma alegoria que reforça o caráter efêmero dos prazeres e nos acende a lembrança da brevidade da existência. Essa série, que pode ser compreendida como uma natureza-morta, atualiza e amplia os limites do gênero na arte contemporânea. Ao contrariar o sentido da luz solar e natural, de cima para baixo, esses canteiros luminosos, construídos com back light, tornam-se ainda mais estranhos e artificiais. É como se ali, sob a pequena área de grama, encerrassem-se corpos enterrados. 

Finalmente, o artista expõe um dos desdobramentos do Projeto 8.0., a seqüência de fotografias que registra uma ação em que, simbolicamente, assassina importantes artistas, críticos e galeristas durante um programa de residência no Paraná, o Faxinal das Artes. Os contornos dos corpos, em referência aos desenhos criminais, foram recortados em placas de madeirite e colocados sobre a grama, impedindo a realização da fotossíntese e gerando os negativos dos cadáveres. Ao final da chacina, essas poéticas marcas, em tom de verde mais claro, interferiram de modo mórbido na paisagem. Em contraste com outros trabalhos do artista, neste, a morte é apresentada com certo sarcasmo, solução estratégica de um artista consciente das limitações impostas para quem vive fora do badalado eixo artístico Rio-São Paulo.
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